Projeto Arqueologia Sankofa fortalece identidade quilombola no Baixo Amazonas
Oficinas de formação patrimonial unem ciência, ancestralidade e acessibilidade em três comunidades quilombolas de Santarém
9/20/20253 min read


Um mergulho no passado para compreender o presente e projetar o futuro. Assim pode ser definido o projeto “Arqueologia Sankofa: Meu Quilombo, Saberes Ancestrais!”, aprovado pela Lei Aldir Blanc do Governo do Estado, que vai percorrer três comunidades quilombolas do Baixo Amazonas, Murumurutuba, Saracura e João Pereira, com oficinas de formação patrimonial inéditas na região.
O primeiro módulo do projeto aconteceu nos dias 19 e 20 de setembro, em Murumurutuba, território escolhido para sediar a abertura por sua importância simbólica. A programação inicial reuniu moradores, lideranças quilombolas e convidados em rodas de conversa e oficinas que introduziram os participantes ao universo da arqueologia e à sua relação com a identidade quilombola.
Ao todo, serão 12 oficinas presenciais, aos sábados, com carga horária de 8 horas cada, reunindo 60 participantes. Os encontros vão abordar temas como o processo de ocupação local, a formação dos quilombos, a chamada “arqueologia afro-referenciada” e os saberes transmitidos pelos mais velhos. Além da vivência, o projeto terá como contrapartida a produção de uma cartilha acessível sobre educação patrimonial e um mini documentário que registrará as oficinas, ampliando a visibilidade dos territórios quilombolas.
Valorização da história e da ancestralidade
Para a coordenadora geral Elaine Pinto, quilombola e arqueóloga que há anos pesquisa os territórios do Baixo Amazonas, a iniciativa é um passo importante no reconhecimento da arqueologia produzida pelas próprias comunidades.
“Pesquisas sobre nossos quilombos ainda são limitadas, mas já contamos com trabalhos importantes. O que tenho escrito no meu mestrado é um dos poucos referenciais sobre a formação e ocupação desses territórios, junto a pesquisas de outros colegas que também vêm contribuindo. Esse projeto é uma forma de devolver às comunidades o conhecimento e valorizar nossa cosmologia, nossa arqueologia e nossa identidade”, destaca Elaine.
O Quilombo Murumurutuba foi escolhido para sediar o primeiro módulo por sua importância simbólica. “É onde iniciamos nossas pesquisas, onde temos apoio constante das lideranças e dos moradores. Murumurutuba é a nossa casa”, afirma Elaine.
Vozes da comunidade
Entre os presentes na abertura estava Jandira Pereira dos Santos, gestora da Escola Municipal São Sebastião, que avaliou a experiência como enriquecedora:
“Foi emocionante ouvir os mais antigos e, ao mesmo tempo, poder aprender fazendo, como na oficina das bonecas afro. Me sinto ainda mais fortalecida como quilombola”, contou.
Já a aluna Maysa Costa destacou a importância da atividade realizada neste sábado:
“A oficina das bonecas africanas me ajudou a entender melhor a história africana e nossa ancestralidade. Foi um aprendizado muito especial para mim.”
Compromisso com acessibilidade e economia local
À frente da coordenação executiva, Rafaela Pinto reforça que o projeto também tem como compromisso a inclusão e acessibilidade.
“Todas as oficinas contarão com intérprete de libras, audiodescrição e material adaptado, feito pela equipe da Keké Bandeira. Queremos garantir que cada etapa seja de fato acessível e que ninguém fique de fora desse processo de aprendizado e valorização cultural”, explica Rafaela.
Todas as atividades do projeto contam com intérprete de Libras, audiodescrição e materiais adaptados. A contrapartida será a produção de uma cartilha acessível sobre educação patrimonial, com tiragem de 200 exemplares para distribuição gratuita nos territórios, além do mini documentário que servirá como registro e divulgação do processo.
Além da formação, o projeto também movimenta a economia criativa local, contratando serviços de produção e alimentação dentro das próprias comunidades e gerando empregos para quilombolas e pessoas com deficiência.
Esse é um trabalho coletivo. A força da FOQS (Federação das Organizações Quilombolas de Santarém), da AQMUS (Associação Quilombola de Murumurutuba), da Associação Quilombola de João Pereira (JP), da Associação Quilombola de Saracura, da Escola Municipal São Sebastião, dos mais antigos e das lideranças locais é o que garante que o Sankofa seja não apenas um projeto, mas um movimento de fortalecimento comunitário.
Com a abertura realizada em Murumurutuba, a expectativa agora é seguir o circuito de oficinas nos outros territórios. A próxima será no Quilombo João Pereira, em outubro, mantendo viva a proposta de unir ciência, ancestralidade, identidade e inclusão no Baixo Amazonas.